"De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha
de ser honesto".

(Rui Barbosa)


sexta-feira, 8 de abril de 2011

A tragédia de Realengo e as armas

Wellington Menezes de Oliveira era mulato, franzino, calado e filho de pais adotivos. Louco, entrou armado na escola onde estudara e assassinou e feriu gravemente crianças que estavam na sala de aula. Em seguida, baleado, se suicidou. O roteiro é o mesmo do que se passou na Virgínia Tech University, nos EUA e na Finlândia, na Jokola High School, em 2007. Ou ainda em Albertville, na Alemanha, em 2009, ou na tristemente famosa Colombine. Um jovem louco entra numa escola armado, dispara contra crianças ou jovens indefesos e depois se mata. Todos, ou quase todos, deixaram suas intenções registradas ou emitiram sinais que permitiriam, se tivessem recebido a atenção devida, evitar a tragédia. Todos desenvolveram habilidades no manuseio de armas e vários as possuíam em número e calibre incompatíveis com a legislação. No escuro, aposto que Wellington não possuía posse e muito menos porte de armas. E que estas foram compradas de terceiros que, ao contrário do que determina o Estatuto do Desarmamento, jamais comunicaram sua venda às autoridades competentes. Caso o assassino fosse detido com os revólveres 38 que ceifou a vida de inocentes, teria sua prisão relaxada, pois ao que parece não tinha antecedentes criminais, e inexistem presos apenas por porte ilegal de arma no país. As probabilidades que os revólveres viessem da polícia ou das Forças Armadas que servem no Rio de Janeiro são altas, na proporção de uma para quatro, já que é do aparato público de Segurança que fluem os maiores estoques de armas nas mãos de terceiros e/ou criminosos. O Brasil tem mais de 17 milhões de armas leves, a esmagadora maioria ilegal e nas mãos de particulares – enquanto o setor público detém pouco mais de dois milhões. O SINARM, banco de dados federal que centraliza todas as informações sobre armamento leve no país, não funciona porque os Estados, que coletam os dados, os enviam ou não ao seu talante. O Estatuto do Desarmamento, peça central na regulação e controle das armas e redução das mortes por armas de fogo, vem sendo sistematicamente ameaçado e desfigurado por parlamentares ligados à indústria e comércio de armas, debaixo do silêncio da opinião pública e da mídia. Sem dúvida, a tragédia de Realengo deflagrará a carnavalização das iniciativas legais de sempre. Teremos outra hipócrita onda de discussão sobre o (des)controle das armas no Brasil. Falarão muito nas crianças que já não estão entre nós. Mas esquecerão de mencionar que as Leis do Estatuto do Desarmamento são inobservadas, descumpridas ou diariamente desfiguradas. Raul Jungmann

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