"De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha
de ser honesto".

(Rui Barbosa)


sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

O fim das coligações proporcionais

Por Leônidas Mendes Filho

Há muito que no Brasil se fala da necessidade imediata de uma reforma política que ceife vícios por demais arraigados na cultura política brasileira, que limite o número de partidos, que corrija as distorções de nosso sistema proporcional, que decrete o fim das coligações partidárias nas eleições proporcionais, isto é, nas eleições parlamentares (para quem não se lembra, para as câmaras municipais, assembléias legislativas e câmara de deputados), etc..


O que temos visto, entretanto, não nos alenta: passa ano, de eleição a eleição, aqui uma local, lá uma geral; renovam-se as promessas; retoma-se vez ou outra o debate; mas, a clamada e multidesejada reforma política não saí: e não sequer do papel, posto que lá ainda não chegou; não saí das intenções, boas ou más.


Aliás, é bom lembrarmos, que as mais significativas alterações em nosso sistema político-eleitoral desde a promulgação de nossa Constituição Cidadã, em outubro de 1988, já mazelada pela prorrogação do mandato do “imortal” José Sarney (de 4 para 5 anos, em troca da distribuição de concessões de rádios e televisões), não se deveu à ação de nossos legisladores, cada vez mais distintos e distanciados dos anseios de uma sociedade em rápido processo de transformação.


Desde as eleições diretas de 1989, as primeiras a contar do malfadado golpe militar de 1º de abril de 1964, não por coincidência o “dia da mentira”, as mais notáveis e transformadoras mudanças em nosso sistema político-eleitoral-partidário provieram do poder judiciário e das “inovadoras” interpretações oferecidas por nossos “supremos”, ou “superiores”, magistrados, se preferir, e pela mobilização popular.


Assim o foram as duas mais recentes e, acreditamos, mais importantes, dessas duas ultimas décadas: a imposição da fidelidade partidária, que resultou na reafirmação, desta feita jurídica, de que os mandatos, legislativos e executivos, pertencem aos partidos, com todas as suas implicações, que mais adiante comentaremos; e a chamada “lei da ficha limpa”, inovador meio de “assepsia em nossa vida política”, como classificou outro comentarista.


Agora, mais uma vez por força da interpretação judiciária, em nosso entender, benéfica e complementar à primeira acima apontada, nossa Corte Suprema (STF), ainda que em decisões monocráticas de seus “supremos membros”, mas em coerência com sua anterior concepção da fidelidade partidária e de que os mandatos eletivos são delegados aos partidos, as denominadas “coligações proporcionais” estão sendo postas em cheque.


Desde as eleições de outubro, os magistrados da “suprema Corte”, ao serem interpelados sobre a posse de suplentes em substituição aos titulares de mandatos legislativos, tanto em nível federal (Câmara dos Deputados) quanto estadual (assembléias legislativas), vêm determinando, coerentemente com o principio do mandato partidário, posse aos suplentes do partido e não da coligação.


Essas “supremas decisões” de nossa Corte Suprema vêm causando polêmica; e, vez por outra, ameaçam uma crise entre os poderes da República. Mas, e talvez por isso mesmo, prometem mais uma inovação em nosso sistema político-eleitoral com claros reflexos em nossa estrutura partidária: ao reafirmarem que os mandatos legislativos pertencem aos partidos e não às coligações, na prática, o STF está decretando o fim das coligações proporcionais.


Importante, entretanto, frisar que as queixas oriundas dos partidos, no caso, especialmente dos chamados “pequenos partidos”, não se justificam, pois que, ainda em detrimento das decisões judiciais, os próprios partidos não demonstram qualquer respeito pelas coligações que promovem, principalmente, quando são derrotadas.


Veja-se, por exemplo, o caso do PDT do Pará: simbólico da capacidade de nossos partidos e de seus líderes e membros em respeitar acordos e coligações. Em 2006, este partido era da base de apoio do então governo estadual peessedebista; coligou-se com o PSDB na disputa eleitoral; depois da derrota, naquelas eleições, aderiu ao governo petista in imediatio.


Agora, em 2010, deu-se o caminho oposto: assentado no governo petista de Ana Júlia, ao PT coligou-se para a disputa eleitoral, por certo “a fim de colher os favores da estrutura governista de campanha”; derrotada esta, não se fez de rogado: em pouco mais de 72 horas, anunciou a adesão ao reposto governo PSDbista; a coligação, criada no calor dos favores governistas, foi renovada. Nas mesmas bases, diga-se.


Em conclusão, e em detrimento dos reclames e queixumes, podemos dizer que as decisões judiciais determinando a posse do suplente partidário em vez do suplente da coligação, só legaliza uma prática há muito adotada pelos nossos partidos: as coligações só existem no processo eleitoral; e sua extinção é mais um louvável e bem-vindo mecanismo de assepsia de nossa vida política.

Leônidas Mendes Filho
AE/Parauapebas

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