"De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha
de ser honesto".

(Rui Barbosa)


quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Plebiscito - O meu Pará (De Belém) já dividido

(Do Blog do Prof. Manuel Dutra)

Nós, paraenses de Belém, somos domesticados desde pequenos a entender que o Pará termina em Ananindeua, um pouco além da área metropolitana. O Pará é um signo, um mantra que sobrevive das lembranças de um passado pujante e esquece o caos e as agruras do povo na corda do Círio de Nazaré. O Pará, do tacacá ao tecnobrega, não bebe na fonte dos outros Parás.



Por Jota Ninos
Pra início de conversa sou filho de uma marapaniense (da terra do carimbó) que um dia cruzou com um comerciante grego e viveu uma paixão tórrida em alguma viela próximo ao Ver-o-Peso e me fiz belenense da gema. Vivi meus primeiros 15 anos de vida no microcosmo da elite de Belém, entre as praças da República e Batista Campos, vendo o mundo do 24º andar do maior espigão amazônico à época, o Manuel Pinto da Silva.
Desde o dia em que cheguei a Santarém, em março de 1978, comecei a descobrir um Pará que eu desconhecia. E entendi que o Pará estava, irremediavelmente, dividido em meu coração.
E este pode ter sido um dos maiores méritos da campanha de rádio e Televisão sobre o plebiscito, que se encerra hoje no Estado do Pará: o Brasil, assim como eu em 1978, começou a descobrir que existe um novo Pará entre tantos Parás que aqui sempre existiram!
Nunca antes na história deste Pará, a mídia nacional e internacional voltou seu foco com tanta insistência para o “sentinela do norte”, como é decantado em seu hino o estado representado pela estrela solitária acima da frase Ordem e Progresso, no Pavilhão Nacional. Aliás, até o hino paraense foi tirado de algum baú da memória para tornar-se refrão de baladas ufanistas de quem não quer dividir o que já está, há muito dividido!
Afinal, o que tem a ver um cidadão de Faro com um de Tailândia ou de Soure? Qual a relação entre o cara que mora em Bonito, o caboclo de Curuá, ou ainda algum roceiro de Bannach? Não estou falando grego: estes são alguns dos 144 municípios desse extenso Pará, de cultura tão diversa.
Os Parás divididos por linhas imaginárias que mal representam qualquer territorialidade, foram expostos visceralmente nesta campanha. Todos, até o governador do Estado (que ficou conhecido na campanha como “SimNão Jatreme”, por sua postura vacilante, ora dizendo-se neutro, ora vociferando NÃO), têm consciência de que o Pará não será mais o mesmo a partir do dia 12/12, independente do resultado das urnas.
Mas o principal mérito da campanha, com certeza, foi fazer com que o povo paraense também descobrisse que o Pará não é só um, e de repente cada um paraense de Belém resolvesse proclamar o seu próprio Pará, embalado pela batuta do publicitário-mor do tucanato paraense, o papa-chibé Orly Bezerra. A cantora Fafá de Belém vaticinou, entre prantos e cantos em um dos programas ufanistas de Orly, que ninguém divide “o meu Pará”!
O Pará de Fafá é o mesmo de Ganso, o grande jogador santista, de Dira Paes, a atriz global de sucesso, e de Leila Pinheiro e Nilson Chaves, entre outras celebridades do mundo artístico paraense que foram declarar seu voto em clipes no estilo “We are the world”. Para quem do outro lado acredita que o Pará não é esse de Belém, destilou-se o ódio contra aqueles que um dia embalaram nossos ouvidos com a genuína música paraoara (ou parauara), com o gosto do tucupi azedo que os belenenses adoram (eu aprendi a gostar também do tucupi doce de Santarém).
Como paraense de Belém, entendo o sentimento de todos os que participaram da campanha e se empenharam em negar que existe uma divisão. Nós, paraenses de Belém, somos domesticados desde pequenos a entender que o Pará termina em Ananindeua, um pouco além da área metropolitana. O Pará é um signo, um mantra que sobrevive das lembranças de um passado pujante e esquece o caos e as agruras do povo na corda do Círio de Nazaré. O Pará, do tacacá ao tecnobrega, não bebe na fonte dos outros Parás. As demais regiões são apenas lugares exóticos onde um bom paraense de Belém vem desfrutar férias, depois de cansar do sal de Salinas ou do “algodão” de Algodoal.
É esse o Pará da chorosa Fafá que nenhum paraense de Belém quer ver dividido. Fafá que já foi de Belém do Pará (hoje é mais de Portugal), um dia até tentou tirar o codinome Belém num de seus primeiros discos, mas recuou a ser repreendida pela elite parauara. É essa Fafá que chora um Pará que ela mesma renegou um dia e que ainda não conhece tão bem… Mas não deixarei de ouvir Fafá, por conta disso. Acredito que continuaremos sendo amazônidas, convivendo numa grande área que terá que se dividir, seja agora após o plebiscito, seja em outro momento qualquer.
Helenilson Pontes: o político “banana” que merecemos!
Esta foi a única campanha da história do Brasil onde um marketeiro de renome internacional foi alvo de campanha sórdida, movida pela mídia do Pará de Belém. Duda Mendonça, de herói do marketing nacional virou bandido saqueador, e todos os seus podres foram reverberados por uma mídia raivosa comandada por Maioranas e Barbalhos.
E Duda atacou o coração do tucanato com peças que expressaram o descrédito dos paraenses, aqueles de Belém, no seu líder maior, Simão Jatene. Aliás, o Pará de Belém não tem líderes políticos, tem apenas arremedos de caudilhos, órfãos baratistas ou não. Não que isso não se repita no Pará de Carajás ou no Pará do Tapajós. Aqui e alhures também temos deficiência de políticos sérios, mas isto não quer dizer que não seja legítimo o desejo de se emancipar. Esse desejo não é apenas uma pretensão de “políticos oportunistas” como quis fazer crer a campanha orlysta.
Aliás, enquanto todos os políticos em cada região se uniram em torno da mesma causa, SIM ou NÃO, Santarém vai ter que conviver com mais um “político banana” em sua recente história. Repetindo o folclórico Odair Corrêa (o vice dos mil e um seguranças), o vice-governador, o santareno (será?) Helenilson Pontes, se acovardou e comeu abiu. E mesmo quando o “chefinho querido” saiu em campo para defender o Pará de Belém, Helenilson ficou posando de bom moço no papel que mais adora representar: de iluminado-tecnocrata-tributarista-engravatado-reunindo-com-ministros. Não só se calou covardemente, como impediu que os nordestinos que ainda acreditam nele por aqui, não dessem qualquer contribuição para a campanha do SIM! Helenilson é a Ponte que caiu, nesse plebiscito. É o político-banana da hora, que merecemos…
O desejo secular reprimido e a vazão nas novas mídias.
As diferenças culturais seculares, o desejo de desmembrar – naturalmente – aquele gigante adormecido conhecido como “Província do Grão-Pará e Maranhão”, nomenclatura imposta pelo colonizador português que nunca respeitou as diversas culturas do norte e nordeste (tapajoara, marajoara, manauara e tantas outras), permearam os sonhos daqueles que lideraram em séculos passados o surgimento de novos territórios amazônicos e nordestinos. Mas o Pará e o Amazonas continuam grandes, ainda sufocando algumas destas culturas em seus territórios. Nos últimos 60 anos, várias tentativas foram feitas através de projetos apresentados no parlamento, até que em maio deste ano, fomos quase que surpreendidos por uma votação na Câmara Federal que nos jogou no colo um pleito plebiscitário.
O paraense de Belém, de repente, foi sacudido por algo que não conhecia. E foi aproveitando este desconhecimento que a campanha orlysta privilegiou o marketing ufanista e tacanho sobre o “grande Pará” e o “Parazinho”. Siglas como FPE, PIB, IDH, IPEA, IDESP entremeadas de cores vermelhas da bandeira contra o verde do SIM, acenderam discussões apaixonadas e passaram a fazer parte do nosso cotidiano. Os políticos do SIM foram execrados como “esquartejadores”, “separatistas”, “oportunistas”, “estrangeiros”, num festival de xenofobia e discriminação de políticos da elite de Belém, de olho nas eleições da capital.
A internet foi invadida por hordas de internautas numa batalha de palavras, muitas vezes permeada pela passionalidade em detrimento do raciocínio. Ou com ataques vis com incitação à violência, de uma virulência exacerbada.
Como sempre acontece em campanhas eleitorais, os programas de rádio e TV não conseguiram ir a fundo no debate das questões principais. E os debates televisivos entre os líderes das Frentes então, foram meros shows de pantomima perdidos entre minutos e segundos de réplicas e tréplicas, onde no final todo mundo venceu, de acordo com o programa do dia seguinte…
Na segunda-feira saberemos qual estratégia de marketing conseguiu alcançar seus objetivos. Este jornalista, que um dia já foi paraense de Belém, agora é e sempre será paraense do Tapajós. E seja SIM ou seja NÃO, segunda-feira estarei pronto para as novas batalhas que todos os tapajoaras enfrentarão, sem medo de ser feliz (menos o banana do Helenilson…).

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