"De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha
de ser honesto".

(Rui Barbosa)


quarta-feira, 17 de novembro de 2010

O blocão

Por Merval Pereira
Por que será que o PMDB nunca pensou em montar um bloco de centro-direita durante o governo Lula como o que está montando agora, quando a presidente eleita Dilma Rousseff começa a decidir a formação de seu ministério?
Por que ninguém sabe o que vai predominar na engenharia política que está sendo montada, talvez a duas cabeças, para a futura administração petista.
No governo Lula, nenhum dos partidos da base governista tentou uma rebelião branca por que primeiro Lula era maior não apenas que o PT, mas também que o PMDB e os demais partidos de sua base.
Sobretudo, porém, por que todos confiavam em que Lula enquadraria o PT para abrir espaço no seu governo, cujo objetivo maior sempre foi eleger Dilma Rousseff.
Agora, cada um trata de cuidar de si até que a nova presidente dê o ar de sua graça e mostre aos aliados quem é que manda no seu governo, qual será a linha de atuação.
O PMDB começou a se mexer quando sentiu o cheiro de carne queimada na disputa das presidências da Câmara e do Senado.
Tendo perdido nas urnas a prerrogativa de ser a maior bancada da Câmara por 9 deputados – o PT elegeu 88 deputados contra 79 do PMDB -, os peemedebistas já tentavam um acordo de cavalheiros com o PT para um rodízio na Câmara, a exemplo do que fizeram na legislatura anterior.
Mas como na nossa política faltam cavalheiros, o PT lançou a idéia de fazer o rodízio também no Senado, onde o PMDB tem uma maioria incontestável: tem 20 dos 81 senadores, enquanto o PT tem 14.
Ao mesmo tempo, o PMDB passou a ver a disputa dentro do próprio PT do grupo comandado pelo ex-deputado José Dirceu que tenta barrar a ida do ex-Ministro Antonio Palocci para um posto de importância dentro do governo, ainda mais se for dentro do Palácio do Planalto, como a chefia do Gabinete Civil ou uma Secretaria-Geral turbinada.
Essa briga de foice no escuro, que está sendo travada neste momento, será o primeiro sinal que os políticos e o público de maneira geral receberão sobre as tendências do futuro governo Dilma.
Por enquanto tudo indica que as idéias defendidas por Palocci quando estava no Ministério da Fazenda vão prevalecendo, e o atual Ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, que era seu aliado naquele momento na tentativa de conter custos do governo, continua sendo o porta-voz das mesmas idéias, até o momento sem ser contestado por ninguém do futuro governo.
Há também indicações de que a postura, digamos, mais proativa do Ministro da Comunicação Social Franklin Martins a favor de um maior controle social dos meios de comunicação, anunciando até mesmo um confronto se necessário para a regulamentação das telecomunicações, não está de acordo com o que a presidente eleita quer em matéria de relacionamento com os meios de comunicação.
Nos dois casos, a presidente eleita tem emitido sinais que contradizem sua atuação como ministra no Gabinete Civil, o que pode indicar que uma vez eleita, as imensas responsabilidades do cargo passaram a ditar seus compromissos, e não um eventual voluntarismo que porventura guiasse suas decisões anteriormente.
O blocão formado por PMDB, PP, PR, PSC e PTB, com 202 deputados federais no total, é uma demonstração de que uma eventual tendência esquerdista não terá respaldo no Congresso, mesmo que na teoria o governo tenha o domínio de praticamente 70% daquela Casa, com o apoio de dez partidos políticos de peso: PT (88), PMDB (79), PP (41), PR (41), PSB (34), PDT (28), PTB (21), PSC (17), PCdoB (15), PRB (8).
A formação desse agrupamento político de centro-direita, com o vice-presidente eleito
Michel Temer como coordenador informal das negociações parlamentares, não apenas deixa o PT isolado com seu grupo de esquerda tradicional (PC do B, PDT, PSB) como demonstra que a vitória petista nas urnas não significa que haverá apoio político para um governo de esquerda que radicalize em pontos polêmicos como, por exemplo, os incluídos no Programa de Direitos Humanos.
Também na questão puramente fisiológica há uma barreira às intenções petistas de ampliar seus poderes para cima dos aliados.
O PT quer não apenas a presidência da Casa, mas quer de volta ministérios que perdeu no segundo governo Lula para que a aliança governista acomodasse os representantes de outros partidos.
Mas o que o PMDB e seus seguidores querem é pelo menos manter essa partilha de poder do jeito que Lula deixou, o que quer dizer que o PP quer manter o Ministério das Cidades, o PMDB o de Minas e Energia e o PRB o de Transportes, todos na suposição de que haverá mais investimentos nos próximos anos.
O PT encontrará também uma reação forte de um antigo aliado, o PSB, que foi o partido da base que mais cresceu proporcionalmente nas últimas eleições e não se conforma mais em ser apenas um apêndice do PT.

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