Há muito, Noel não passa por essas bandas. O trenó abarrotado de presentes, que a cada final de ano deixa o Pólo Norte não gosta de dar rasantes pela terra de muro baixo. Apesar da idade, que poderia torná-lo um velho senil, Noel não é bobo, nem nada; vai que aparece um esperto, desses que proliferam e saracoteiam pela pacata Rio de Águas Rasas e resolve bater-lhe a carteira, ou então surrupiar a carga para vender no mercado negro... Melhor não, além do mais, há crianças muito mais pobres nos municípios vizinhos.
Na verdade, o bom velhinho anda com os pacovás cheios e não é pra menos; são tantos pedidos estapafúrdios e fora de propósito que mesmo para ele, passado na casca do alho uma centena de vezes, são de lascar o cano. Imagine que um dia desses, um pouco antes de levantar acampamento da Lapônia, uma enxurrada de pedidos deram o ar da graça. Melhoria nos serviços de telefonia celular, denúncias contra a Rede/Celpa, água na periferia e mais transparência e menos jogadas ensaiadas na administração municipal, imagina você que teve um camarada que pediu melhor sorte para o PFC em 2011. Diante disso nem é preciso ser muito inteligente para deduzir o porquê da recusa de Noel em aparecer por aqui, afinal, apesar do ar de metrópole que se esparrama pelas fazendas adjacentes, isso aqui recebe muita gente do norte e um monte de gente do sul. Há alguns anos, uma trupe de lourinhos se abancou aqui e entre um tchê e outro, tomou a cidade de assalto e desde então a malta está mandando prender e soltar. Resumo da ópera: a cidade vai mais ou menos, mas os caras estão com os burros na sombra.
Enquanto conduz as renas com habilidade para ares mais saudáveis, Papai Noel se lembra dos pedidos trazidos pelos duendes. Ora, onde já se viu! Reclamar da Rede/Celpa, da Tim, da Vivo... se fosse na Lapônia, seria justiça com as próprias mãos, mas no Brasil tudo era mais civilizado, há tempos não se ouvia falar em quebra-quebra.
A água que teimava em não comparecer nas torneiras é algo mais sério, mas pouco há para fazer, afinal, há seis anos ele ouve a mesma ladainha e olha que seis anos não são seis dias, “é, o Caldo de peteca não se emenda mesmo, nem com muito dinheiro ele não consegue colocar água nas torneiras. Talvez com a chegada do inverno, a periferia vai ter água, pelo menos a que cai do céu”, resigna-se o bom velhinho.
Enquanto se afasta, toca o telefone celular. Era o duende-chefe querendo saber se resolvera o problema do PFC, “é que o Roque tem me ligado...”, diz, à guisa de justificativa. “Ora, diz pro Roque contratar novos jogadores, do goleiro ao ponta esquerda”.
Definitivamente já não se faz papai Noel como antigamente. Esse de agora não tem o menor saco, aliás, saco até que ele tem, mas estão cheios de presentes para meninos mais comportados.
(Artigo publicado no HOJE 440 - Coluna do Marcel)
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