Maracanã tomado pela torcida do Flu
Antes que recortem e colem para me contestar no Twitter, prestem atenção no ponto de interrogação: por enquanto, estou perguntando, não afirmando. Até porque não sou bom em previsões. Ontem, uma senhora de cabelos brancos me abordou num shopping. “Vocês não estão percebendo”, me disse ela. “O Botafogo vai ser campeão brasileiro.” Não sou muito bom em respostas de bate-pronto quando encontro um telespectador do SporTV na rua, até porque nesses momentos costumo estar pensando em tudo menos futebol. Nesse caso, a única que me ocorreu foi: “Moça, eu só percebo essas coisas na última rodada…”
Talvez não chegue a tanto, mas ainda não me acostumei com o longo prazo do Campeonato Brasileiro de pontos corridos. E nisso acho que estou irmanado com muitos torcedores. Hoje, quando li a tabela de classificação no Troca de Passes, a única pergunta que quis fazer a Renato Maurício Prado e Telmo Zanini foi se já podíamos começar a apontar quem vai ser campeão, quem vai para a Libertadores, quem vai cair. Fui respondido com um inevitável “É muito cedo”. Inevitável, mas para mim sempre frustrante. Eu, como fã de futebol, tenho pressa. Quero um favorito a cada rodada.
No bloco seguinte, mostramos os gols da vitória do Fluminense sobre o Internacional – e foi aí que fiquei com a pergunta do título na cabeça. Renato observou que a vitória não apenas ampliou a liderança, mas também a distância para um potencial candidato ao título. E Telmo lembrou que Muricy Ramalho é um técnico que sabe identificar os jogos decisivos ao longo de um campeonato sem finais. Mesmo depois de terem dito que é muito cedo, ambos concordaram que o Tricolor vai brigar pelo título até o fim.
Então: pintou o campeão? Tá bom, é muito cedo. Mas ninguém no Brasil entende mais de pontos corridos do que Muricy, campeão três vezes seguidas nesse sistema. E pouca gente entende mais de futebol do que ele. Seus detratores costumam atacá-lo justamente pelo desempenho em mata-matas. E agora têm a passagem pelo Palmeiras para argumentar que ele também pode desperdiçar uma grande vantagem na liderança.
Curiosamente, o outro aviso de que tudo pode dar errado vem justamente das Laranjeiras. No ano passado, o Fluminense precisava vencer as sete últimas partidas do campeonato para não cair. Venceu seis, empatou uma, não caiu e virou o argumento da vez para provar que as estatísticas sempre estão erradas. É interessante o efeito que essas arrancadas têm na cabeça do torcedor. Elas representam justamente o outro lado da conta, são a prova de que é dificílimo, quase impossível fazer o que fez o time de Cuca no ano passado. Mas viram baluartes do combate à matemática.
Num divertido livro lançado recentemente no Brasil, batizado de Soccernomics para navegar na onda do sucesso de Freakonomics, o escritor Simon Kuper e o economista Stefan Szymanski fazem as contas para provar, por exemplo, que não há a menor lógica em achar que a Inglaterra chega a uma Copa do Mundo como favorita (como eu fiz na África do Sul; mas me deem um desconto, a Espanha também estava na minha lista!). O raciocínio é simples: o percentual de jogos vencidos pelos ingleses não os qualifica a esse status. E o desempenho em Copas recentes, menos ainda. Era a mesma linha que seguia, no ano passado, quem dizia que se o Fluminense tinha feito 27 pontos em 31 partidas, não era razoável esperar que fizesse 21 (ou os 19 que bastaram, com a combinação de resultados) em sete. Pura matemática – essa que o futebol gosta de desmentir, mas muito menos do que o torcedor gosta de acreditar.
Então: pintou o campeão? O Fluminense, a esta altura do campeonato, no ano passado, tinha 14 pontos. Agora, tem 32. Com a base daquela arrancada, reforçada, antes de mais nada, pelo técnico. Foi Muricy que fez com que o time, que no ano passado tinha um lateral direito que a torcida queria banir do futebol (Mariano), tenha agora um lateral direito que a torcida começa a pedir na seleção (Mariano). E trocasse um volante que os torcedores vigiavam na vida noturna carioca (Diguinho) por um volante que ameaça a entrada de Belletti no time (Diguinho).
Além dos reforços que já estavam lá, há os que chegaram. Belletti pode até não jogar, mas Deco tem tudo para entrar – e bem – no time. Para resolver se seu estilo de jogo se encaixa com o de Deco, há sempre ele, Muricy. No ataque, o veterano Emerson faz gols para superar a bronca pela perda de Alan, e Washington faz os gols que pressionam Fred a voltar logo.
Não é exatamente matemática, mas para mim é lógica. O Fluminense tem tudo para brigar pelo título brasileiro até o fim, como previram Renato e Telmo (e quando digo brigar até o fim, espero poupar os teclados daqueles que já se preparavam para perguntar “E O MEU TIME????”, com as letras maiúsculas e as interrogações repetidas da indignação; há, sim, outros times capazes de abalar o favoritismo tricolor, e não vou citar um ou outro aqui porque não é esse o tema do post).
Mas o impacto desses momentos em que o mundo vira de cabeça para baixo – ainda que, insisto, eles sejam poucos – é tão grande que prefiro manter a posição de minha resposta de bate-pronto à senhora no shopping: só vou perceber se é isso mesmo na última rodada. Se quiserem saber antes, perguntem ao polvo.
(Blog do Marcelo Barreto)
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